MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO BUSCA PISTAS NOS CELULARES DE RONNIE LESSA PARA CHEGAR AO MANDANTE DO CASO MARIELLE
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Publicado em 15/03/2022

À frente das investigações da Força-Tarefa do Caso Marielle e Anderson, o promotor Bruno Gangoni acredita que ainda há fios da meada ainda a serem puxados para se chegar ao mandante do crime. Na segunda-feira, quando o assassinato da vereadora Marielle Franco (Psol) e do motorista Anderson Gomes completou quatro anos, aumentou a pressão sobre ele e a Polícia Civil para a elucidação do caso. Houve inclusive protestos organizados pelas famílias das vítimas com cobranças ao governador Cláudio Castro, ao Tribunal de Justiça do Rio e ao Ministério Público do Rio (MPRJ). Segundo o Google, as buscas pela pergunta “quem mandou matar Marielle”, em sua plataforma de pesquisa, quadruplicaram neste mês comparado ao mês passado, embora eles não tenham divulgado o número de acessos.

Gangoni disse ter recebido novas imagens de câmeras da Cet-Rio, de residências e de estabelecimentos comerciais do trajeto do carro dos assassinos, da Barra passando pelo Centro e o Estácio, onde houve a emboscada à parlamentar, que estão sendo analisadas pelo setor de inteligência do Ministério Público do Rio (MPRJ). Os promotores, oito focados no caso, seguem também na cobrança ao Facebook para obterem a lista das pessoas que acessaram o perfil de Marielle, para ver seu post do evento na Casa das Pretas, onde a vereadora esteve antes de ser assassinada. Para Gangoni, essa informação poderia reforçar as provas contra o sargento reformado da Polícia Militar, Ronnie Lessa, preso na Penitenciária de Campo Grande, em Mato Grosso do Sul, ou mesmo levar ao mandante. Mas apesar das dificuldades, o promotor analisa que o trabalho foi importante para a descoberta do "Escritório do Crime", grupo de matadores de aluguel que, para ele, exportou seu know-how  para outros bandos ensinando a matar.

Por que é tão difícil chegar ao mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco?

Em todo homicídio é muito mais difícil identificar o mandante do que o executor. Essa é uma regra geral nestes casos. Quando você tem um executor profissional como Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz (acusados de terem atirado e dirigido o carro na emboscada, respectivamente) essas dificuldades aumentam, porque eles tomam cuidados para não deixar rastros. Chegar aos executores já é difícil. Por ser um profissional como Lessa, há uma dificuldade maior para se chegar ao mandante. O profissionalismo dos executores, sem dúvidas, é um dos principais fatores para se chegar ao mandante. Tudo foi pensado.

Qual o maior desafio neste caso? É o fato de ele ser policial militar e ter sido adido na Polícia Civil, passando a conhecer as técnicas de investigação?

Sem dúvidas, Lessa sabe como se investigar. O que ele não esperava é que, a partir das investigações da Marielle, outras técnicas passaram a ser desenvolvidas e, com isso, chegamos nele. Foi a partir dessa investigação que o Gaeco mergulhou nesse submundo do crime que ninguém mexia. A partir daí você teve a Intocáveis 1, 2, 3 e 4. Descobriu-se o Escritório do Crime, o uso de tecnologia para se praticar os homicídios do empresário Marcelo Diotti, o policial reformado da PM Anderson Claudio da Silva, o Andinho; e do Alcebíades Garcia, o Bidi, (todos ligados à contravenção). A partir do Gaeco (que atua no caso desde meados de 2018, quando assumiram as promotoras Simone Sibílio e Letícia Emile) enveredou-se nesse submundo do crime, no qual vários homicídios relacionados com as milícias e a contravenção vieram à tona. Vários homicídios com a assinatura do Escritório do Crime, por exemplo, de puro profissionalismo. O homicídio do Bidi é de uma sofisticação ímpar: são anotações de como efetuar a emboscada com fotografias e uso de drone. É um estudo mesmo, até com rotas de fuga! Não tem amador. Com as investigações, os principais líderes morreram, outros estão presos. Alguns homicídios continuam e, tudo indica, que o Escritório do Crime passou seu conhecimento para outras quadrilhas que eram menos profissionais.

Como estão as investigações agora? O que estão fazendo?

Conseguimos chegar aos executores, com o grande trabalho do Ministério Público do Rio. Estamos revisitando o processo, conseguimos acesso a alguns telefones que, no momento da apreensão, por questões de tecnologia, a gente não conseguiu quebrar as senhas ou ver o que tinha neles. Hoje em dia, com a versão atualizada do Cellebrite comprada pelo MPRJ, conseguimos desbloquear telefones, principalmente os de Ronnie Lessa. Vamos passar os celulares dele, que são modernos, no equipamento e extrair mais coisas que foram apagadas. Novas linhas de investigação estão sendo trilhadas pela Força-Tarefa da Marielle e Anderson.

Quais são as principais provas neste caso?

O MPRJ nunca teve uma força de trabalho tão grande neste caso como temos atualmente. Tem muito material ainda que não foi analisado. São oito promotores que estão dedicados, escutando áudios, lendo mensagens. A prova é praticamente digital nesse homicídio e as empresas de tecnologia vão se aperfeiçoando. Estamos fazendo pedidos de forma diferente do que havia sido feito. Temos feito pedidos para Facebook, Google. Este último tem nos ajudando bastante. A Google nos deu dados que relutou em entregar no passado. Depois de três instâncias, a gente se sentou para negociar com eles. Conseguimos um diálogo. O nosso problema é com o Facebook que ainda não nos passou quem foram as pessoas que buscaram pelo perfil de Marielle, a partir da postagem que ela fez do evento na Casa das Pretas. Essa questão é mais delicada para eles, por conta da intimidade do usuário. O Facebook rebate que não pode repassar os dados por questões técnicas e de quebra de privacidade, mas estamos argumentando que basta acessar a ferramenta que aparece uma propaganda relacionada à consulta que foi feita. Você entra numa página qualquer e aparece um algoritmo. O nosso argumento é que o crime precisa ser solucionado e essa pode ser uma importante pista para isso.

A Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) com apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) prendeu o ex-vereador e ex-miliciano Cristiano Girão por um homicídio na Gardênia Azul, na Zona Oeste, seu antigo reduto. Essa era a linha de investigação que ligava Girão a Lessa e, consequentemente, ao assassinato de Marielle. Como estão essas investigações?

Girão foi acusado de ter contratado o Lessa para esse homicídio na Gardênia. O Gaeco não ouviu o Girão. O celular dele foi apreendido e nada de relevante foi encontrado. Mas é uma linha de investigação.

Qual a linha de investigação mais forte das que vocês seguem?

Não há nenhuma linha nova. Temos revisitado o material produzido que ainda não tinha sido analisado antes: contas telemáticas e até imagens novas de câmeras encaminhadas pela DHC. São imagens recolhidas de câmeras da Cet-Rio, de residências e de estabelecimentos comerciais ao longo do trajeto da Barra da Tijuca (onde o Cobalt usado pelos assassinos foi visto na noite de 14 de março de 2018), passando pela Casa das Pretas, no Centro e, finalmente, no Estácio, onde ocorreu a emboscada.

Como o senhor define o assassinato de uma parlamentar negra, mulher, LGBTQIA+ em pleno estado democrático de direito?

 É um crime que atenta contra a própria atividade política dela. Uma vereadora que teve uma votação expressiva. É um atentado à democracia, sem dúvidas.

O senhor e sua equipe de promotores vão chegar ao mandante?

Não posso prometer que se vá chegar ao mandante. Seria leviano da minha parte prometer isso.  O MPRJ nunca teve tantos promotores exclusivamente trabalhando para esse caso. Temos todos os órgãos técnicos, o pessoal da Coordenadoria de Segurança e Inteligência (CSI), que analisa as imagens. Prometo trabalho, suor e dedicação. Tenho esperança. Acho que a gente pode procurar. Há muito material ainda para se analisar. E acho que, possivelmente, iremos encontrar algo. 

 

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