Ano de 2024 é marcado por rusgas entre governos Zema e Lula
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Publicado em 27/12/2024

O ano de 2024 termina com avanços importantes para o governo de Minas em projetos que dependiam de intervenções de Brasília. Entre eles está o que cria um programa com condições especiais para o pagamento de dívidas dos estados com a União, conhecido como Propag, aprovado no Senado com a presença do governador Romeu Zema (Novo).

Ainda assim, o ano ficou marcado também por trocas de farpas entre os governos estadual e federal. Crítico recorrente do governo Lula (PT), Zema e seu vice, Mateus Simões (Novo), usaram as redes sociais e entrevistas para questionar o petista em diferentes assuntos.

Contra as ‘saidinhas’

Em janeiro, Simões dirigiu-se ao presidente Lula com um pedido para reconsiderar a extensão das saídas temporárias de fim de ano concedidas a presos com bom comportamento. A solicitação surgiu após um sargento da Polícia Militar de Minas Gerais, Roger Dias da Cunha, ser baleado por um criminoso que deveria ter retornado ao sistema prisional dias antes.

Simões utilizou suas redes sociais para criticar a medida, apontando que as saídas temporárias contribuem para a insegurança pública. “Que o presidente Lula reconsidere a extensão das ‘saidinhas’ que tão festivamente foram anunciadas no fim de ano e que tanto mal fizeram, como fazem a cada ano. Prisão se cumpre na cadeia”.

O governador Romeu Zema também se manifestou sobre o tema, destacando a necessidade de revisar leis que permitem a liberação de presos com histórico de violência. “Leis ultrapassadas podem tirar a vida de mais um policial em Minas. Bandidos com histórico de violência são autorizados para ‘saidinha’, que resulta em insegurança para todos brasileiros. Passou da hora disso acabar. A mudança está parada no Congresso. Até quando?”, questionou.

Traídos pelo governo

Em maio Mateus Simões afirmou que o governo de Minas se sentiu traído pelo governo federal devido à ausência de avanços significativos nas negociações da dívida do estado com a União. Segundo ele, o presidente Lula havia prometido uma solução, mas, cinco meses depois, as conversas não evoluíram como esperado. Simões explicou que a proposta inicial envolvia abater a dívida em troca de ativos do estado, como empresas e imóveis, mas a União não apresentou alternativas concretas.

“O principal problema na discussão da dívida é que a promessa feita pelo presidente Lula, de que acataria a proposta do presidente Pacheco, não se transformou em realidade na conversa que o ministro Haddad teve conosco. O presidente Lula foi na televisão e disse que garantia uma solução para o problema da dívida de Minas. E a solução para o problema da dívida de Minas é um abate na dívida em troca de ativos. A gente entrega empresas, entrega imóveis, e reduz o valor da dívida”, avaliou Simões.

“Então, nos sentimos traídos por Brasília, porque estávamos prontos para votar o regime de recuperação na Assembleia de Minas, um tema difícil e complexo, a Assembleia estava mobilizada. Paramos tudo porque o governo federal prometeu uma solução. Passados cinco meses, estamos parados praticamente no mesmo lugar, sem que uma proposta venha para a mesa”.

Simões defendeu a federalização da Codemig como uma solução para diminuir a dívida de Minas. Ele afirmou que o ativo foi avaliado em R$ 60 bilhões e destacou que até deputados petistas em Minas concordam com esse valor. No entanto, ele pediu cautela no processo de avaliação para evitar uma possível depreciação. A expectativa, segundo o vice-governador, era que uma solução fosse alcançada até julho, antes do recesso do Congresso Nacional.

‘Esquizofrenia política’

Em julho, Mateus Simões anunciou que o governo estadual não pretendia acelerar a votação do Regime de Recuperação Fiscal (RRF) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) enquanto aguardava uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o adiamento do prazo para retomada dos pagamentos da dívida.

Ele disse que seria uma ‘esquizofrenia política’ forçar os deputados mineiros a votar uma proposta que poderia ser superada por alternativas discutidas no Congresso Nacional.

“A partir do momento que o projeto foi apresentado no Senado e nós peticionamos ao Supremo pedindo mais prazo, não vejo sentido em submeter os deputados mineiros à votação do RRF. Seria uma esquizofrenia política pedir que os deputados votem um projeto de lei que terá uma alternativa consagrada pelo Congresso Nacional em semanas”

Ações climáticas

Em setembro, durante a Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque, o vice-governador Mateus Simões revelou que a comunidade internacional estava preocupada com a postura do governo brasileiro em relação às questões climáticas. Ele afirmou que o governo federal era incapaz de apresentar dados confiáveis e um plano de ação climática robusto, o que estaria gerando tensão entre líderes internacionais.

Simões destacou que as dificuldades do Brasil em cumprir compromissos mínimos climáticos refletem a falta de organização técnica do governo Lula. “O governo federal não está conseguindo fechar os dados do Brasil, não está conseguindo pôr de pé o plano de ação climática”, disse à Itatiaia.

Encontro sobre segurança pública

Em outubro, Zema decidiu não participar da reunião convocada pelo presidente Lula com governadores para discutir um plano integrado de segurança pública. Em ofício enviado ao Palácio do Planalto, Zema justificou sua ausência mencionando a falta de resposta do governo federal às demandas apresentadas por governadores do Sul e Sudeste.

Entre as reivindicações estavam mudanças em audiências de custódia para crimes graves e maior integração entre forças de segurança. O governo do estado também se mostrou crítico à Pec da Segurança Pública, apresentada pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski.

“Apesar da apresentação das propostas ao Ministério da Justiça, ainda não tivemos uma resposta satisfatória sobre os pontos apresentados. Nem mesmo recebemos quais serão os termos da PEC da Segurança a ser apresentada ao Congresso. Por isso, aguardo um avanço mais objetivo, com a apresentação de uma proposta de forma prévia aos governadores, para que possamos estudar e nos preparar para uma reunião construtiva com encaminhamentos concretos”

Zema classificou o encontro como potencialmente improdutivo sem propostas concretas. O governador foi representado pelo Secretário Adjunto de Segurança Pública, coronel Edgard Estevo.

Zema subiu o tom

O mesmo tema foi abordado pelo governador em 2 de novembro, desta vez pelas redes sociais e em tom mais crítico. Zema criticou o foco excessivo em debates sobre segurança pública em vez de ações efetivas, destacou os altos índices de homicídios no Brasil e afirmou que endurecer as leis para manter criminosos reincidentes presos seria o primeiro passo para resolver o problema.

“O básico é colocar atrás das grades aquele que é criminoso. Aqui no Brasil nós temos criminosos que roubam uma, duas, três, cinco, dez, vinte vezes e continuam soltos. Fazer o básico, na minha opinião, é o primeiro passo. Isso desmotiva a nossa polícia, que prende também cinco, dez vezes, e vê o criminoso solto novamente. Isso é uma ducha de água fria no ânimo das polícias. É preciso mudar esta regra, endurecer esta regra. E debate, como eu falei, pouco serve enquanto este tipo de fato estiver acontecendo”

Sem citar nomes, Zema criticou decisões judiciais que ele considera politizadas, sugerindo falta de credibilidade no sistema judiciário. Ele também pediu maior atenção às fronteiras do país, argumentando que a entrada de armas e drogas contribui para o fortalecimento do crime organizado.

Corte de gastos

Na COP 29, em Baku, também em novembro, Zema afirmou não acreditar que o governo federal promoveria cortes de gastos efetivos. Ele criticou a administração Lula por priorizar debates em vez de ações concretas e chamou as medidas anunciadas de superficiais, sem impacto real. O governador também defendeu uma reforma administrativa para reduzir a carga tributária e tornar o estado mais eficiente.

“Esse governo parece que é mestre em ficar discutindo, em ficar debatendo e muito pobre em ação. Quem quer, faz. Quem não quer, fica aí debatendo, passando para a imprensa que vai fazer, mas ação mesmo, zero”

Zema destacou que a falta de decisões efetivas por parte do governo federal prejudica o avanço de reformas fundamentais. Ele reiterou a necessidade de um estado mais enxuto como caminho para um crescimento sustentável.

Mais críticas à segurança

Antes do Cosud, o Consórcio de Integração Sul e Sudeste, Simões voltou a criticar a PEC da Segurança Pública apresentada pelo governo federal. Simões afirmou que a proposta enfraqueceria a Polícia Militar de Minas Gerais e acusou o governo Lula de não saber manejar suas próprias forças de segurança.

“Se o governo federal quer o apoio dos estados para a reforma que ele quer fazer na segurança, a primeira coisa que ele tem que fazer é fazer o serviço dele, porque ele não consegue pôr a polícia dele pra funcionar direito. Então se ele puser a polícia dele pra funcionar direito, depois ele pode vir aqui aprender com a gente como é que a gente faz a nossa polícia funcionar

Simões sugeriu que o governo federal deveria aprender com os estados do Sul e Sudeste a gerir a segurança pública. Ele citou episódios como o roubo de um carro da comitiva presidencial durante o G20 para exemplificar falhas na segurança federal.

‘Irresponsável’

O governador Romeu Zema criticou a política econômica do governo Lula, chamando-a de “irresponsável” e prevendo que ela resultará em aumento de juros, inflação e perda de confiança no país. Zema comparou o cenário atual ao governo Dilma Rousseff, afirmando que a má gestão fiscal pode causar recessão e desemprego.

“Tenho certeza que não é esse tipo de governo que nós estamos tendo que vai dar certo. Irresponsável nos gastos, sem nenhum projeto de futuro para o Brasil, o projeto deles é para o partido e para a turminha deles”.

Respostas do governo

O governo federal também lançou suas críticas a Zema. Em março, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), disse que o governador não tomou iniciativa para buscar soluções para a dívida de Minas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). “Você veja que o governador Zema jamais foi recebido pelo governo anterior para discutir essa questão da dívida, também não procurou. Não houve nenhuma negociação em torno da dívida de Minas”, disse Haddad.

Outro embate veio em outubro. Após Romeu Zema afirmar que não cobraria o DPVAT em Minas Gerais, o governo federal, por meio da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), esclareceu que a autonomia para tal decisão é da União.

Zema declarou: “Vejo como absurdo a volta da cobrança do DPVAT, que sempre foi um seguro imposto e não um seguro opcional. Ele só serve para enriquecer amigos dos poderosos que no passado ganharam milhões com esse pagamento. Aqui em Minas não vamos cobrar isso dos proprietários de carros.”

Ele também criticou a gestão federal: “Não vou mandar essa conta para o mineiro. Temos um governo federal que só está pensando em aumentar impostos e aumentar arrecadação, hora nenhuma fala em austeridade e em economizar.”

O ministro Alexandre Silveira (PSD) rebateu as declarações, chamando-as de “demagogia”. “Enquanto o governador de Minas Gerais cobra um dos IPVAs mais caros do Brasil, também discursa fingindo que não aumentou imposto de produtos no estado.”

O DPVAT foi extinto em 2020, mas um projeto aprovado em 2023 reintroduziu o imposto, agora rebatizado como SPVAT, com previsão de cobrança a partir de 2025.

Haddad voltu a criticar a postura de Zema em relação à renegociação da dívida de Minas Gerais com a União em dezembro. O ministro mencionou que Zema tem adotado uma conduta conflitiva, dificultando as negociações.

“Dos R$ 160 bilhões que Minas deve, um terço da dívida foi contraída no governo Zema. Inexplicavelmente, ao invés de se aliar ao presidente Pacheco para resolver o problema, ataca nas redes sociais e na imprensa”, afirmou Haddad.

Trégua

Se o ano ficou marcado por trocas de farpas e acusações, pelo menos em um momento a trégua prevaleceu entre o governo estadual e o presidente. Em junho, durante um evento em Belo Horizonte para o anúncio de investimentos, Mateus Simões representou o governador e foi vaiado quando chamado ao palco para discursar. O presidente Lula precisou intervir.

“O vice-governador não está aqui só porque quer. Ele está aqui porque nós o convidamos. Então, como nós, pernambucanos e mineiros, somos muito gentis, temos que respeitar quem vem à nossa casa. Pode falar, governador”, afirmou Lula, que deixou sua cadeira no palco e falou ao microfone ao lado de Simões, que devolveu a gentileza.

“Presidente Lula, muito obrigado mais uma vez por estar em Minas Gerais. Recebemos aqui o senhor, com muita alegria, principalmente em uma oportunidade como ontem e hoje, em que o senhor vem fazer anúncios importantes para o Estado. Acho que muito antes de qualquer divergência política e partidária e ideológica, o importante é colocar Minas Gerais à frente em todos os temas”.

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