Pouco antes de o rompimento da barragem da Samarco, em Mariana, completar quatro anos, a mineradora conseguiu, no Conselho Estadual de Política Ambiental de Minas Gerais (Copam), nova licença para voltar a operar. Enquanto isso, desde 2015, Simone Silva, moradora de Barra Longa, cidade a cerca de 60 km de Mariana, luta para que seus filhos sejam reconhecidos como atingidos pela lama da barragem que se rompeu naquele ano.
“Tem sido uma guerra de luta e resistência”, resumiu Simone.
Simone tem exames que demonstram o adoecimento de Deivid, de 17 anos, e de Sofya, que tinha 9 meses à época do rompimento. A menina, hoje aos 5 anos, tem alergias respiratórias severas, com febre e uso de medicação contínua. Além disso, ela tem problemas de pele. E, segundo a mãe, todos os problemas começaram no dia que a lama atingiu a cidade.
Desde então, Simone é militante símbolo de luta entre os atingidos pela lama que derramou da cidade.
“Tem outras Sofyas em Barra Longa, tem outros David em Barra Longa. O problema é que, na maioria das vezes, as pessoas têm medo da fundação [Renova] porque acha que ‘ah, se eu abrir o bico que tô contaminado, que a minha família está contaminada, vou ser perseguido igual você é’”, contou Simone.
O Ministério Público Federal reconhece o caso de Simone Silva como passível de receber reparação pelos danos causados à saúde de sua família. Como ela, muitos atingidos sentem que não têm expectativa de melhora para o futuro. Milhares deles, de Mariana até o mar, passado por mais de 40 cidades entre Minas Gerais e o Espírito Santo.
A Fundação Renova afirmou que não comenta casos específicos. Mas informou que, "estudos epidemiológicos e toxicológicos estão em andamento para analisar os impactos do rompimento na saúde da população. O Estudo de Avaliação de Risco à Saúde Humana por Resíduos Perigosos, com metodologia da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde, é financiado pela Fundação Renova, acompanhado e supervisionado pela Câmara Técnica de Saúde, ligada ao Comitê Interfederativo".
Volta da Samarco
O Conselho Estadual de Política Ambiental de Minas Gerais (Copam) decidiu no dia 25 de outubro pela concessão de uma licença que permite a Samarco voltar a operar em Mariana. Dez dos 12 conselheiros votaram a favor. Um se absteve e apenas um foi contra.
Após o rompimento, a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do estado (Semad) suspendeu, em agosto de 2016, todas as licenças relacionadas à operação da mineradora na cidade. A empresa ficou, apenas, com as autorizações para obras emergenciais para garantir a estabilidade das estruturas remanescentes na mina e também para controle do dano ambiental no local.
A licença corretiva, aprovada pelo Copam, substitui 36 licenças anteriores e reúne 14 processos de licenciamento que estavam em aberto.
Resumo destes quatro anos
O MP estima que sejam 700 mil atingidos em todo o território. Segundo a Fundação Renova, criada para reparação dos atingidos, 319 mil pessoas receberam algum tipo de indenização ou auxílio financeiro emergencial. Destes, 9.120 indenizações foram pagas para quem teve perda de renda ou bens materiais.
Em 2016, 22 pessoas se tornaram rés da ação penal. Mas 13 acabaram excluídas do processo. Em abril deste ano, a Justiça Federal decidiu retirar a acusação de homicídio e lesão corporal dos outros acusados, que vão responder por inundação qualificada.
A reconstrução dos três distritos está atrasada. Bento Rodrigues, que deveria ficar pronto em agosto de 2020, só deve ser entregue em dezembro do próximo ano, segundo a Fundação Renova. Paracatu de Baixo está em fase de terraplanagem e Gesteira só teve o local escolhido.
O Rio Doce é um dos pontos que mais sofreu danos ambientais. A lama atravessou mais de 700 km do rio, até chegar ao mar e atingir corais em Abrolhos, na Bahia. Uma pesquisa da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apontou concentração de mercúrio e chumbo nas amostras de peixes acima da quantidade de ingestão máxima tolerada.