O Ministério Público Federal (MPF) apresentou recurso contra sentença de primeira instância que absolveu os réus em ação penal movida pelo rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em novembro de 2015, em Mariana (MG). No recurso, o MPF pede a condenação das empresas Samarco Mineração S/A, Vale S/A e BHP Billiton Brasil Ltda., além da empresa Vogbr Recursos Hídricos e Geotecnia Ltda. e mais seis executivos e técnicos. O rompimento, no dia 5 de novembro de 2015, causou a morte de 19 pessoas, sendo considerado uma das maiores tragédias ambientais do país.
A decisão publicada pela regional de Ponte Nova, em 14 de novembro, justifica a absolvição com base na “ausência de provas suficientes para estabelecer a responsabilidade criminal” direta e individual de cada réu envolvido no caso. Agora, no recurso, que será julgado pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6), o MPF questiona esse argumento.
“Questiona também como a sentença percorre pelos requisitos da tipicidade objetiva e subjetiva, especialmente na avaliação do nexo de causalidade, concluindo que, embora todos os réus fossem garantidores de vigilância da estrutura, não seria possível que lhes fossem atribuídos os resultados delitivos”, informou texto do MPF.
Conforme o procurador da República Eduardo Henrique de Almeida Aguiar os crimes ambientais como esse não ocorrem pela conduta de uma pessoa isolada, mas, em regra, pela atuação de uma grande empresa, com complexa estrutura organizacional, nas quais várias pessoas colaboram. O procurador aponta que as falhas individuais nas competências de determinadas pessoas são responsáveis pelo resultado e suficientes à demonstração da causalidade pelo aumento do risco.
“No recurso, o MPF rebate todas as premissas que foram, no entendimento do órgão, equivocadamente construídas e levaram à incorreta absolvição dos denunciados, como, por exemplo: o recuo do eixo da barragem, com sucessivos alteamentos sobre região menos estável (lama), por tempo excessivo, foi uma das causas para o rompimento da barragem de Fundão; os gerentes da Samarco denunciados foram omissos ao não preencherem o recuo, após recomendação expressa dos consultores, mas, “inexplicavelmente”, como afirma o MPF, a decisão de primeira instância aponta que não haveria nexo de causalidade entre a omissão e a não evitação dos resultados danosos”, disse o texto do MPF.
Além disso, o MPF lista 22 pontos que demonstram a omissão dos acusados ao longo dos anos, como a não realização dos estudos de suscetibilidade à liquefação, o aparecimento de trincas, a construção de berma de equilíbrio subdimensionada e a não retificação do eixo de um dos diques da barragem, recomendados por um grupo de especialistas que avalia tecnicamente e de forma independente as estruturas de armazenamento de rejeitos e das barragens.
Crimes
O MPF pede a reforma da sentença e a condenação dos réus por diversos crimes ambientais e outros relacionados à gestão de risco. Os crimes incluem poluição ambiental, destruição de fauna e flora, e causar dano à saúde humana ou ao meio ambiente, com agravantes devido à negligência e omissões que levaram ao rompimento.
Os dois diretores e os três engenheiros da Samarco denunciados respondem por crimes como poluição qualificada e destruição de recursos naturais. Já as empresas Samarco Mineração, Valee Vogbr Recursos Hídricos e Geotecnia Ltda, além de um engenheiro da Vogbr, são acusados do crime de emissão de laudo ambiental falso e de terem responsabilidade por danos ambientais.
As empresas Samarco Mineração, Vale S/A e BHP Billiton também respondem pela prática de poluição ambiental, destruição de ecossistemas e atos que resultaram em grave risco à saúde e à segurança pública. O MPF reforça ainda a incidência de agravantes devido à gravidade das omissões, aos danos em larga escala e à violação de normas ambientais.
O outro lado
Por meio de nota, Vale reafirmou “seu compromisso com a Samarco, com a reparação e a compensação integral dos danos às famílias, comunidades e ao meio ambiente.”
Segundo a mesma, a decisão do juízo federal de Ponte Nova “reforça que a empresa atuou dentro da legalidade e com respeito às normas ambientais.”