Dominique Pelicot, que admitiu ter drogado sua mulher, Gisèle Pelicot, e recrutado desconhecidos na internet para abusarem sexualmente dela ao longo de uma década, foi condenada por 20 anos de prisão pela Justiça Francesa nesta quinta-feira (19). Os 51 acusados foram condenados a penas de 3 anos (dos quais, 2 deles a um tipo de pena em regime aberto) há 20 anos.
Isso tudo após três meses e meio de audiências e 3 dias de deliberação. Nenhum pedido de absolvição foi aceito, mas as condenações foram mais leves do que aquelas pedidas pela acusação. Os homens, que têm de 27 a 74 anos, de todos os meios sociais, foram condenados pela agressão sexual e estupro de Gisèle Pelicot, sedada previamente pelo marido, Dominique. Ele foi quem recebeu a pena mais alta: 20 anos.
A maioria dos estupradores vai cumprir pena inferior a 10 anos de prisão. Alguns deles serão detidos ainda nesta quinta. No fim de novembro, o MP pediu 10 a 18 anos de reclusão contra 49 dos então acusados, por estupro, e 4 anos de prisão contra o outro acusado, por importunação sexual Gisèle.
“Senhor Pelicot, em relação ao conjunto dos fatos, o declaramos violentos de estupro com agravantes”, declarou Roger Arata, presidente do tribunal de Avignon, no sul da França.
O réu de 72 anos, que recebeu o veredicto de culpa de pé e sem expressar nenhuma emoção, nunca negou ter drogado Gisèle com ansiolíticos entre 2011 e 2020 para que ela dormisse e conseguisse estuprá-la ao lado de homens desconhecidos que ele contatou pela internet. Depois, no momento da leitura das condenações de corréus, curvou o corpo e chorou, de acordo com a BBC.
Ao longo do julgamento, que começou em 2 de setembro e atraiu a atenção da imprensa internacional, Gisèle renunciou ao seu direito de anonimato e defendeu que os vídeos dos abusos fossem exibidos na Corte. A vítima argumentou que a medida era importante para “permitir que sua história chegasse ao mundo” e para transferir a “vergonha” de volta para os acusados.
Ele pediu desculpas à francesa, de quem se divorciou após 50 anos, e à família. Sua advogada, Béatric Zavarro, apelava que o tribunal se “afastasse” do pedido da promotoria pela condenação máxima, de 20 anos de reclusão, e considerasse os “traumas” que o cliente sofreu durante a infância, incluindo um estupro aos 9 anos.
O segundo réu a receber um veredicto foi Jean-Pierre Marechal, condenado a 12 anos de prisão. Ele foi considerado culpado por dopar e estuprar a mulher, Cillia. Ao tribunal, o homem disse ter “seguido a liderança” de Dominique Pelicot e convidado o colega para abusar da própria esposa.
Além do estupro agravado, Karim Sebaoui, Adrien Longeron e Nicolas Francois foram considerados culpados pela posse de imagens de pornografia infantil. Francois foi sentenciado a 8 anos de prisão com banimento de trabalhos envolvendo crianças, enquanto Longeron pegou 6 anos e Sebaoui. Hughes Malago e Andy Rodriguez, por sua vez, foram culpados por tentativa de estupro com fatores agravantes, e Joseph Cocco (3 anos de prisão) e Saifeddine Ghabi, por agressão sexual.
Durante o julgamento, Gisèle pediu que a sociedade “machista e patriarcal” mude sua atitude em relação ao estupro e falou sobre sua indignação por nenhum de seus agressores ter alertado a polícia. Alguns a estupraram até seis vezes.
Alguns réus admitiram os estupros e outros se defenderam sob a alegação que acreditavam participar de uma fantasia de um casal libertino, pois tinham “o consentimento do marido”. Outros 20 suspeitos seguem em liberdade porque os investigadores não conseguiram identificá-los.
“Obrigado Gisèle”
A decisão do tribunal foi acompanhada de perto na França e também no exterior, onde o julgamento e sua vítima Gisèle Pelicot se tornaram um símbolo das agressões sexuais contra as mulheres. Os réus, com idades entre 27 e 74 anos, têm perfis sociais diversos.
Profissionais de 180 veículos de comunicação - 86 estrangeiros - foram credenciados para acompanhar a leitura do veredicto, mas apenas quatro tiveram acesso à sala principal do tribunal. Laure Chabaud, uma das representantes do Ministério Público, desejou durante o julgamento que a decisão do tribunal fosse além do destino dos acusados, enviasse “uma mensagem de esperança às vítimas de violência sexual” e servisse para concretizar uma “mudança” na sociedade.
As associações feministas também esperam que o julgamento mude a atitude das pessoas em relação ao estupro, tentativa de estupro e agressão sexual, denunciado na França por mais de 200.000 mulheres a cada ano. O caso também ajudou a personificar o flagelo das vítimas de agressão sexual, em particular por meio do uso da submissão química, na figura de Gisèle Pelicot.
“Obrigado Gisèle”, afirma uma faixa estendida no centro histórico de Avignon, diante do tribunal.