CASO JOÃO PEDRO: MÃE CRITICA DECISÃO APÓS " INVESTIGAR ELA MESMA "
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Publicado em 12/06/2021

Na última quinta-feira, recebi a notícia de que a polícia concluiu que os policiais "não tiveram a intenção" de matar meu filho, João Pedro. A Delegacia de Homicídios (DH) terminou a investigação e os indiciou por homicídio culposo, sem a intenção. Por mais incrível que possa parecer, eu não fiquei surpresa. Isso é o que acontece quando a polícia investiga ela mesma. Como eles "não tiveram a intenção" de matar, se invadiram uma casa de família e deram mais de 70 tiros em direção a um lugar onde só havia crianças?

Isso nunca aconteceria se fosse na Zona Sul, lá eles não entram numa casa de família atirando. Existe muito preconceito, muito racismo. Acham que quem mora na favela não é gente de boa índole. Meu filho era um jovem negro e estava numa casa bonita, com piscina e churrasqueira, dentro de uma favela. Por isso, foi morto.

Hoje, a minha esperança na luta por Justiça está no Ministério Público. Eu espero que a conclusão dos promotores seja diferente e que os policiais sejam denunciados pelo crime, por matar com intenção. Eles chegaram atirando em direção a uma casa onde só havia crianças brincando. Precisam responder por isso.

Eu nunca mais voltei na casa onde meu filho foi morto. Não voltei e não quero mais voltar. Aquela casa é da família do meu marido. Usávamos nos finais de semana, para juntar a família. Eram momentos felizes, mas tudo acabou com a morte do meu filho. Ele estava ali para se divertir com os amigos, já que não podia sair por causa da pandemia. Não tenho coragem de entrar ali de novo.

Na verdade, para mim, é uma luta diária estar na minha própria casa, que também fica no Complexo do Salgueiro. É a casa onde vi meu filho crescer, onde o criei. Eu ainda vivo aqui, no mesmo lugar, infelizmente. Mas estou aqui só de corpo, de alma não. Tudo o que eu queria era sair daqui, sair dessa casa, sair do Salgueiro.

Ao longo do último ano, vivi muitos dias difíceis, dias de muita dor. No Natal, geralmente passamos na igreja, junto a nossa comunidade. No ano passado, não consegui sair de casa. No último Dia das Mães, sofri muito, porque o João Pedro morreu no dia 18 de maio, oito dias depois do Dia das Mães. Tenho muitas lembranças daquele dia, que foi um dia feliz que passamos juntos.

Foi nesse dia, aliás, que dei o último presente para o meu filho. João Pedro torcia pro Fluminense, era tricolor. Por causa da Covid-19, eu comprei uma máscara do Fluminense e dei para ele naquele dia, para estimulá-lo a usar a proteção. Ele ficou feliz demais, mas não teve nem tempo de usar. Foi morto uma semana depois.

Voltar à rotina foi difícil, mas nós tivemos que voltar. O João Pedro tem uma irmã, a Rebeca, que hoje tem 5 anos, e queremos dar tudo de melhor para ela. Eu sou professora e tive que voltar a trabalhar no ano passado ainda. É difícil, porque a escola em que trabalho é a mesma em que ele estudava. Tem vezes que passo por alguns lugares e lembro de estar com ele ali, de dar um beijo nele ao longo do dia. Já meu marido, pai do João, está desempregado. Ele trabalhava com transporte escolar de crianças. Com a pandemia, as crianças ficaram em casa, e ele perdeu o emprego. Agora, está procurando. Precisamos seguir em frente.

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